Ifrane Atlas Saghir
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Comuna rural | ||||
Paisagem na região de Ifrane Atlas Saghir no final de janeiro de 2015 | ||||
Localização | ||||
Localização de Ifrane Atlas Saghir em Marrocos | ||||
Coordenadas | 29° 13′ 22″ N, 9° 29′ 22″ O | |||
País | Marrocos | |||
Região (1997-2015) | Guelmim-Es Semara | |||
Província | Guelmim | |||
Características geográficas | ||||
População total (2004) [1] | 11 950 hab. | |||
Altitude | 830 m | |||
Outras informações | ||||
Soco semanal | domingo | |||
Sítio | www.ifrane.org |
Ifrane Atlas Saghir, Ifrane Anti-Atlas ou Ifrane de l'Anti-Atlas (em árabe: جماعة إفران الأطلس الصغير) é uma localidade do sul de Marrocos, situada na cordilheira do Anti-Atlas, 23 km a leste de Bouizakarne e 180 km a sul de Agadir, que faz parte da província de Guelmim e da região de Guelmim-Es Semara. Em 2004 tinha 11 950 habitantes,[1] praticamente todos de etnia berbere. Foi um dos primeiros locais habitados no sul de Marrocos e até meados do século XX teve uma forte presença judaica que, segundo a lenda remonta ao século VI a.C.[2] Os judeus chamavam ao lugar Oufrane.
Descrição
[editar | editar código-fonte]Ifrane (singular: ifri) significa "grutas" em tamazight (berbere), e tem origem nas numerosas grutas que existem na região.[nt 1] Outra teoria sobre a origem do nome é que este teria derivado de Bene Efraim (filhos de Efraim), o clã judaico que se estabeleceu no local.[3]
Na realidade, Ifrane é um conjunto de três duares (aldeias) que rodeiam um núcleo central designado soco (mercado), que funciona como centro comercial e administrativo. O conjunto estende-se ao longo do vale do uádi (rio) Assife n Ifrane, situado a uma altitude entre 750 e 850 m e que se abre a sul depois de percorrer as montanhas com cerca de 1 200 m que rodeiam a localidade a norte. Cada duar tem o seu próprio casbá[2] e é ocupado por um clã tribal e a proximidade entre eles é mais geográfica do que cultural.[nt 1]
Além daqueles douars (Idaouchkera, Amsra, Rba n Tuzzunt e Tankert),[nt 1] existe ainda a mellah, o bairro dos judeus, atualmente semi-arruinada e onde já não vivem quaisquer judeus,[2] embora algumas casas tenham sido ocupadas por famílias locais após a saída dos judeus. A sinagoga da mellah foi restaurada em 1999[4] por iniciativa conjunta do Ministério da Cultura marroquino e da Fundação do Património da comunidade judaica de Marrocos.[2]
Nas inúmeras grutas da região há vestígios arqueológicos, muitos deles inexplorados. Ifrane é também conhecida pela sua prestigiada escola alcorânica, célebre pelo seu nível académico no estudo aprofundado do árabe e teologia islâmica e por ter acolhido Mokhtar El-Soussi como estudante durante quatro anos.[nt 1]
“ | Ifrane são quatro pequenos castelos edificados pelos numidas, distantes uns dos outros por um espaço de três milhas, sobre um pequeno rio, que corre no inverno e seca no verão [...] nos castelos há diversos artesãos, alguns deles que fazem trabalhos de fundição e de recipientes de cobre [...] os habitantes são de uma grande civilidade na sua atitude, e têm hábitos de honestidade muito arreigados e uma ordem muito agradável [...] quanto às coisas criminais, outra punição não é ordenada além do banimento. | ” |
Judeus de Ifrane Atlas Saghir
[editar | editar código-fonte]Segundo a tradição oral, Ifrane Anti-Atlas foi o local de Marrocos onde existiram judeus em tempos mais remotos. Segundo essa tradição, alguns israelitas abandonaram a Palestina no tempo de Nabucodonosor, rei da Babilónia, depois da primeira destruição do Templo de Jerusalém, em 587 a.C., e foram-se deslocando cada vez mais para ocidente, atravessando o Egito e a orla setentrional do Saara, acabando por chegar aos limites do Anti-Atlas em 361 a.C., tendo começado por instalar-se nas grutas das margens do assif Ifrane após terem pago aos amazighs autóctones para que os autorizassem a fazê-lo.[nt 1]
Segundo outra versão da lenda, os judeus teriam chegado a Ifrane logo no século VI a.C.[2] e Oufrane foi a capital de um reino judaico fundado ainda antes da destruição do segundo templo de Jerusalém.[3] Os judeus continuaram a habitar a região depois do reino ter desaparecido e nos séculos seguintes a população judia foi aumentou com a chegada de mais judeus durante o período romano e após a chegada dos árabes.[5] Embora esteja por esclarecer a veracidade destas histórias, há indícios de que a presença judaica em Ifrane seja anterior ao Islão e a área foi uma das últimas do sul de Marrocos a ser convertida ao islamismo.[2] No século XVI também se instalaram em Oufrane alguns sefarditas ibéricos fugidos à perseguições da Inquisição.[5]
Os judeus da região eram chamados Ait Yussouf. Viviam não só em Ifrane, onde residia o seu patrono sagrado, mas por toda a parte inferior do vale do Drá, entre Akka e a costa atlântica. Mantinham boas relações com as tribos berberes locais.[5]
Devido à sua localização estratégica nas rotas comerciais das caravanas que atravessavam o Saara, nomeadamente as do Sudão, a mellah prosperou entre os séculos XVII e XIX. As principais mercadorias das caravanas eram goma, incenso, plumas de avestruz, marfim, ouro e peles. Sob a proteção do reis de Tazeroualt, os judeus de Ifrane transacionavam nos mercados regionais e no porto de Tassourt (Essaouira, Mogador para os portugueses), onde outros judeus tinham um papel importante no comércio de exportação.[5]
Ifrane perdeu grande parte da sua importância económica no século XIX, à medida que o transporte comercial feito por caravanas foi substituído pelo transporte marítimo. Apesar disso,[5] a comunidade judaica de Ifrane persistiu até à década de 1950, quando se iniciou a debandada dos judeus de Ifrane para Israel e, em menor escala, para Casablanca e Rabat.[2] Em 1958, os últimos judeus emigraram em grupo para Israel,[4] mas ainda hoje os mais velhos se recordam dos penosos adeus, apesar das diferenças religiosas, pois esses judeus berberes faziam parte da história e da cultura de Ifrane e sempre viveram em paz e fraternidade com os seus vizinhos muçulmanos.[nt 1]
O rabino Iúçufe ibne Almumine (Youssef ben Mimoun; supostamente morto em 5 a.C.) foi um dos santos judeus mais venerados e a sua reputação ainda hoje atrai alguns turistas judeus a Ifrane vindos de todas as partes do mundo, que também vão ao cemitério de Ifrane para venerar os túmulos de outros santos aí enterrados,[nt 1] apesar do cemitério estar de tal forma arruinado que mal se distinguem as lápides funerárias.[6] Outro dos santos judeus sepultados em Ifrane é Ed Mrara.[5]
Os Cinquenta Mártires
[editar | editar código-fonte]Em 1790, o sultão alauita Mulei Iázide iniciou o seu reinado tirânico, que foi marcado por pogroms contras os judeus por todo o Marrocos. Em Ifrane 50 judeus foram executados na fogueira, provocando a fuga do resto da população até ao fim do reinado de Iázide em 1792.[3] O acontecimento tornou-se uma lenda e é relatado por Pierre Flamand no seu livro Diaspora en Terre d'Islam, Les Communautés Israelites du Sud ("Diáspora em Terra do Islão, As Comunidades Israelitas do Sul"):[5]
“ | Sessenta judeus de Ifrane estavam a trabalhar no soco. Um feiticeiro chamado Bouhalassa chegou ao soco acompanhado de bandidos armados. Bouhalassa[nt 2] queria provar o seu poder. Inspirado pelo Sultão Mulei Iázide, ele acorrentou os sessenta judeus e torturou-os. A população local, que tinha tratado os judeus muito bem, conseguiu libertar dez deles.
Bouhalassa deu a escolher aos restantes judeus entre a conversão ao Islão ou a morte. Ele preparou uma grande fogueira. Os judeus decidiram atirar-se para o fogo em grupo, em vez de permitirem que um só deles se convertesse. Um a um, todos se atiraram para o fogo. A lenda conta que uma coluna de fumo se ergueu até ao céu, e à noite um candelabro de fogo desceu dos céus. Em resultado disso, as perseguições aos judeus pararam. Dez judeus e trinta muçulmanos juntaram as cinzas e levaram-nas para o cemitério em Ifrane. As cinzas dos mártires foram enterradas e tornaram-se um local importante de peregrinação. |
” |
Segundo outra versão do martírio, a decisão de se lançarem para a fogueira foi do líder da comunidade, Yehuda Ben-Nathan Effiat, que, dando o exemplo se atirou para o fogo. As cinzas dos mártires foram enterrados numa gruta que ainda hoje existe, afastada cerca de 1 km da mellah. Os descendentes de Yehuda Effiat emigraram depois para Londres, onde se tornaram mercadores de sucesso.[3]
Notas
Referências
- ↑ a b «Recensement général de la population et de l'habitat 2004». www.hcp.ma (em francês). Royaume du Maroc - Haut-Comissariat au Pan. Consultado em 9 de dezembro de 2011
- ↑ a b c d e f g Ellingham, Mark; McVeigh, Shaun; Jacobs, Daniel; Brown, Hamish. The Rough Guide to Morocco (em inglês) 7ª ed. Nova Iorque, Londres, Deli: Rough Guide, Penguin Books. p. 619-621. 824 páginas. ISBN 9-781843-533139
- ↑ a b c d «Ifrane d'Anti-Atlas Cemetery». JewishMorocco.org (em inglês). Digital Heritage Mapping, Inc. D'fina: Jewish Treasures of Southern Morocco, presented by the Diarna Project and the Cahnman Foundation. Consultado em 9 de dezembro de 2011
- ↑ a b «Ifrane d'Anti-Atlas Synagogue». JewishMorocco.org (em inglês). Digital Heritage Mapping, Inc. D'fina: Jewish Treasures of Southern Morocco, presented by the Diarna Project and the Cahnman Foundation. Consultado em 9 de dezembro de 2011
- ↑ a b c d e f g Gold, Rick. «Ifrane Anti-Atlas (Oufrane)». rickgold.home.mindspring.com (em inglês). Visiting Jewish Morocco. Consultado em 9 de dezembro de 2011. Cópia arquivada em 4 de abril de 2009
- ↑ Kjeilen, Tore. «Ifrane d'Anti-Atlas - Jewish heritage». LookLex.com (Lexic Orient) (em inglês). Consultado em 9 de dezembro de 2011
Ligações externas
[editar | editar código-fonte]- Afif, Naima (14 de abril de 2011). «Le cimetière juif d'Ifrane (Anti-Atlas marocain) : étude des pierres tombales». naima.afif.be (em francês). Sítio web pessoal de Naima Afif. Consultado em 9 de dezembro de 2011