Zéfiro (filme)
Zéfiro | |
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Zephyrus | |
Portugal 1993 • cor • 52 min | |
Género | docuficção |
Direção | José Álvaro Morais |
Produção | Grupo de Estudos e Realizações |
Produção executiva | Joaquim Pinto |
Narração | Luís Miguel Cintra |
Elenco | Marcello Urghege Paula Guedes |
Música | Carlos Azevedo |
Cinematografia | Edgar Moura |
Figurino | Frederica Nascimento Luís Mesquita |
Edição | Claudio Martinez |
Lançamento | |
Idioma | português |
Zéfiro é um filme de docuficção histórica português de 1993, realizado por José Alvaro Morais e escrito por Morais com Jorge Marecos Duarte.[1] Na média-metragem, misturando um registo documental e outro ficcional, Luís Miguel Cintra assume o papel de narrador, apresentando um trajeto desde o estuário do Rio Tejo ao longo do Sul de Portugal, paralelamente à fuga de um criminoso (interpretado por Marcello Urgeghe) do país.[2] A produção resultou, para além de um corte cinemático, num corte televisivo com metade da duração, intitulado Margem Sul, mais fiel a um modelo clássico do documentário.[3]
Rodado em 1993, Zéfiro foi estreado a 10 de agosto desse ano, no Festival Internacional de Cinema de Locarno. Comercialmente, o filme foi lançado nos cinemas de Portugal a 16 de setembro de 1994.[4] Em televisão, a RTP2 estreou Margem Sul a 15 de outubro de 1996.[5]
Sinopse
[editar | editar código-fonte]Junto à Igreja de São Vicente de Fora, um criminoso inicia a sua fuga. Lisboa é, geograficamente, a última das cidades mediterrâneas, condenada ao Oceano Atlântico pelo Rio Tejo que divide o país em dois e separa a capital da península de Setúbal. É a rota dos cacilheiros que liga Lisboa e o criminoso à margem sul. Inicia-se uma viagem metafórica e cinematográfica sobre Portugal Meridional, cruzando as planícies alentejanas em direção à serra do Algarve.[6]
Ao chegar à margem sul, o narrador muda de tom. Evoca os povos que se sucederam ou coexistiram ao longo da história do extremo Sul. Várias culturas se juntaram e se mesclam ainda, dando origem a uma identidade bastante singular.[7] O fugitivo, enquanto se esconde dos agentes policiais, tem vislumbres dessa sociedade. Chegando ao mar, o narrador pára a contra-gosto, como se fosse continuar até ao Mediterrâneo tal como o criminoso. De noite, o narrador vira-se com desilusão para o Norte e, atravessando o Rio Tejo, regressa ao ponto de partida: Lisboa.[8]
Elenco
[editar | editar código-fonte]- Marcello Urghege, como 1º Homem-sombra.
- Luís Miguel Cintra, como Narrador.
- Paula Guedes, como Mulher-sombra.
- Inês de Medeiros, como Rapariga de vermelho.
- José Meireles, como Moletilha.
- Rogério Paulo, como Lavrador.[9]
- Fernando Heitor, como 2º Homem-sombra.
- Paulo Pires, como Oficial da Marinha Corto Maltese.
- Alexandre Fernandes, como Marinheiro que dança.
- Manuel Lobão, como Trabalhador preso.
- José Blanco Xil, como Agente da PIDE.
Participações adicionais
[editar | editar código-fonte]- António Antunes, como Eremita.
- Rafael Godinho, como Cantor solista.
- Rancho dos Cantares de Vila Nova de São Bento.
Equipa técnica
[editar | editar código-fonte]- Realização: José Álvaro Morais
- Argumento: José Álvaro Morais e Jorge Marecos Duarte
- Direção de fotografia: Edgar Moura
- Figurinos: Frederica Nascimento e Luís Mesquita[10]
- Som: Vasco Pimentel
- Música: Carlos Azevedo
- Músicos: Miguel Azguime (Percussão), Ricardo Rocha (Guitarra Portuguesa) e Carlos Xavier (Piano)
- Montagem: Claudio Martinez
- Direção de produção: Ângela Cerveira
- Produção executiva: Joaquim Pinto[11]
- Genérico: João Botelho
Produção
[editar | editar código-fonte]Desenvolvimento
[editar | editar código-fonte]Morais planeava a adaptação de A Corte do Norte, de Agustina Bessa-Luís, quando uma série de constrangimentos criaram um impasse que o libertou para aceitar o convite de Joaquim Pinto de participar no projeto televisivo TV Hyke, uma coleção de filmes sobre percursos por Portugal.[12] Quando se disponibilizou para realizar um dos filmes do projeto, "a primeira ideia que tive foi fazer o trajeto entre as duas margens do Tejo em frente de Lisboa. Quando chegámos à outra margem fomos um bocadinho mais abaixo, até Vila Real de Santo António" (José Álvaro Morais).[13]
Desde logo, o realizador considerou que poderia ser interessante criar uma obra híbrida, utilizando uma vertente documental acerca da história do Sul de Portugal para desencadear uma ficção.[14] Para desenvolver consigo estas intenções num argumento, Morais convidou Jorge Marecos Duarte. Basearam-se nos trabalhos do historiador Orlando Ribeiro (que escrevera sobre o Mar Mediterrâneo) e do arqueólogo Cláudio Torres (que defendeu em artigos a ideia de que o Sul do país começa na margem sul do Tejo). Torres serviu de consultor científico da obra e numa das conversas com o autor acerca das suas ideias, explicou-as utilizando um mapa em relevo da Península Ibérica, que seria recriado numa maior escala, em estúdio, para a rodagem.[15] O nível de detalhe despendido na fase de escrita terá tornado o processo de produção bastante célere.
O projeto português foi rodado em 1993 em 35 mm, tendo contado com a produção do GER (Grupo de Estudos e Realizações) e da RTP.[15] Resultou em duas versões diferentes:
- Zéfiro: Corte cinemático, média-metragem de docuficção de 52 minutos.[16]
- Margem Sul: Corte televisivo, curta-metragem documental de 26 minutos.[17]
Casting e equipa
[editar | editar código-fonte]Em Zéfiro, José Álvaro Morais volta a contar com a participação no elenco de Paula Guedes e Luís Miguel Cintra, depois de os ter dirigido em O Bobo. Paulo Pires estreia-se em cinema nesta obra.[18][19] Zéfiro marca também o reencontro do realizador com o cinematógrafo brasileiro Edgar Moura, com quem havia colaborado nas suas primeiras curtas-metragens académicas, em Bruxelas (The Upper Room e El Día Que Me Quieras).[13]
O filme na série TV Hyke
[editar | editar código-fonte]Margem Sul é um dos três telefilmes da coleção TV Hyke, produzida em 1993 por Joaquim Pinto. Cada filme, com um realizador diferente, tem como ponto comum a exploração de locais e trajetos pouco promovidos em Portugal. Joaquim Pinto é o autor do primeiro episódio, Para Cá dos Montes, gravado na aldeia de Seara Velha (Chaves), enquanto António Campos realizou o segundo, A Tremonha de Cristal, no qual explorou as paisagens das salinas e da Ria de Aveiro.[20]
Zéfiro seria o terceiro episódio, mas, enquanto diretor na RTP, Fernando Lopes exigiu que o mesmo respeitasse a duração pretendida para o projeto de 25 minutos.[21] Morais optou por abdicar da maior parte das cenas de ficção, o que resultaria em Margem Sul. Nesta montagem mais fiel ao modelo clássico do documentário, o realizador explora o estuário do Tejo e as suas características Mediterrâneas.[3]
Temas e estética
[editar | editar código-fonte]A média-metragem apresenta elementos de produção televisiva (por exemplo, os atores são tratados em grande plano e nota-se uma montagem cerrada)[14], mas não esconde um fascínio cinematográfico, com influências de road movie.[22] O que mais a caracteriza é, de facto, um movimento de descoberta do Sul de Portugal.[23] O próprio cineasta assumiu que "pareceu-me interessante ir descobrindo o que há para lá desse horizonte (lisboeta) próximo. E não só um horizonte físico, mas um horizonte temporal".[24] Para esse efeito, José Álvaro Morais filma, por um lado, o presente e o passado em invasão do presente, e por outro, o real e o mitológico em invasão do real.[25] É deste modo que os elementos ficcionais da narrativa se mesclam com uma base documental.
Zéfiro conceptualiza o estuário do Tejo como sendo um Mediterrâneo em miniatura e discute a sua importância ao longo do desenvolvimento de Lisboa.[13] Acompanhando a teoria proposta por Cláudio Torres, a obra retrata a história de sucesso do monoteísmo cristão como sendo dependente da estratégia de fortalecimento do império romano. A média-metragem demonstra um ponto de vista claro quando defende que a Reconquista Cristã se fez por via da imposição violenta do seu Deus à comunidade do Sul da Península Ibérica, onde conviviam diversas fés em relativa tolerância. Deste modo, a perseguição policial ao protagonista surge como um paralelismo e resquício desse espírito destrutivo.[26]
Zéfiro encerra uma primeira fase da filmografia de José Álvaro Morais (que inclui Ma Femme Chamada Bicho e O Bobo), na qual o seu prazer em usar espaços urbanos facilmente identificáveis como décor se associa a um cinema do lugar e se incrusta na representação da portuguesidade.[28] Tal é notório desde logo pela atribuição ao filme do nome do vento que conduzia os navegadores dos descobrimentos a Portugal. No seu ensaio acerca do cineasta, João Maria Mendes propõe que o estranho personagem que alude ao herói da banda desenhada Corto Maltese, de Hugo Pratt, funciona como um anjo da guarda do protagonista fugitivo no sentido em que "desviava a atenção de Espanha, substituindo-a por um imaginário do Mediterrâneo Oriental, talvez abruptamente importado para ali, e que levava o filme a não atravessar a fronteira, concluindo-se na foz do Guadiana, diante de Ayamonte".[23] Com Peixe-Lua verifica-se, então, o início de uma nova fase, na qual o cineasta continua a interessar-se numa reflexão sobre o Sul, mas as fronteiras desaparecem e as suas personagens percorrem livremente o território Sul de toda a Península Ibérica.[29]
Distribuição
[editar | editar código-fonte]Zéfiro foi selecionado para a 46ª edição do Festival Internacional de Cinema de Locarno (Suíça), onde estreou a 10 de agosto de 1993. Em Portugal, a obra ante-estreou a 16 de junho de 1994, numa sessão na Cinemateca Portuguesa (Lisboa). Sendo distribuído pela Atalanta Filmes, o filme teria estreia comercial no país a 16 de setembro do mesmo ano, no cinema King (Lisboa). Tal decorreu no âmbito de Lisboa '94 (Capital Europeia da Cultura), juntamente com o lançamento de Manual de Evasão (Edgar Pêra), Pax (Eduardo Guedes) e Três Palmeiras (João Botelho).[4] No mês seguinte, a média-metragem chegou ao Brasil, quando integrou a seleção da 18ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo.[8] Em televisão, a RTP2 estreou a versão reduzida da obra, o documentário Margem Sul, a 15 de outubro de 1996.[5]
A 2 de setembro de 2005, dia de aniversário de José Álvaro Morais, a Atalanta Filmes lançou em DVD uma edição de três discos da obra integral do realizador, na qual constam Zéfiro e Margem Sul. Os DVDs incluem depoimentos de colaboradores e atores que trabalharam com o cineasta, como Agustina Bessa-Luís e Luís Miguel Cintra, entre outros.[17]
Referências
- ↑ «Le réalisateur portugais José Alvaro Morais est décédé.». CinéSéries (em francês). 1 de fevereiro de 2004. Consultado em 22 de março de 2021
- ↑ «Todo o José ÁLVARO MORAIS» (PDF). webcache.googleusercontent.com. Consultado em 22 de março de 2021
- ↑ a b Portugal, Rádio e Televisão de. «Margem Sul - Filmes - RTP». www.rtp.pt. Consultado em 22 de março de 2021
- ↑ a b «Cinema Português». cvc.instituto-camoes.pt. Consultado em 23 de março de 2021
- ↑ a b «Margem Sul @ CinePT-Cinema Portugues [pt]». webcache.googleusercontent.com. Consultado em 23 de março de 2021
- ↑ SAPO, Zéfiro - SAPO Mag, consultado em 22 de março de 2021
- ↑ Zéfiro, consultado em 22 de março de 2021
- ↑ a b «43ª Mostra Internacional de Cinema - Filme - Zéfiro». 43.mostra.org. Consultado em 22 de março de 2021
- ↑ «Zéfiro – Elenco e Equipe no MUBI». mubi.com. Consultado em 22 de março de 2021
- ↑ «ZÉFIRO». FREDERICA NASCIMENTO (em inglês). Consultado em 22 de março de 2021
- ↑ Nascimento, Frederico Lopes / Marco Oliveira / Guilherme. «Zéfiro». CinePT-Cinema Portugues. Consultado em 22 de março de 2021
- ↑ «Cinema Português». cvc.instituto-camoes.pt. Consultado em 23 de março de 2021
- ↑ a b c «Untitled» (PDF). webcache.googleusercontent.com. Consultado em 22 de março de 2021
- ↑ a b Faro, Cineclube De. «Cineclube de Faro: da Biblioteca do CCF - entrevista a José Álvaro Morais sobre Zéfiro (em exibição no Museu)». Cineclube de Faro. Consultado em 22 de março de 2021
- ↑ a b 7945062. «Enquadramento #11: José Álvaro Morais». Issuu (em inglês). Consultado em 23 de março de 2021
- ↑ «Zéfiro José Vieira Kinorama A exibição não comercial de cinema Prey The Future 163» (PDF). webcache.googleusercontent.com. Consultado em 23 de março de 2021
- ↑ a b Gomes, Kathleen. «Faro 2005 homenageia José Álvaro Morais». PÚBLICO. Consultado em 10 de março de 2021
- ↑ «Filme de Carlos Saboga nos cinemas franceses» (PDF). webcache.googleusercontent.com. Consultado em 22 de março de 2021
- ↑ «Le Linee di Wellington - Linhas de Wellington - Lines of Wellington - Les Lignes de Wellington». alfamafilmes.com. Consultado em 22 de março de 2021
- ↑ «TV Hyke | Brinca Brincando». 13 de agosto de 2019. Consultado em 22 de março de 2021
- ↑ 7945062. «Enquadramento #11: José Álvaro Morais». Issuu (em inglês). Consultado em 23 de março de 2021
- ↑ Redacção (25 de janeiro de 2019). «Ciclo "Recordando José Álvaro Morais" e debate com Beatriz Batarda e Luis Miguel Cintra». Comunidade Cultura e Arte. Consultado em 22 de março de 2021
- ↑ a b «ENSAIOS» (PDF). webcache.googleusercontent.com. Consultado em 22 de março de 2021
- ↑ «Cineclube de Faro». cineclubefaro.blogspot.com. Consultado em 23 de março de 2021
- ↑ Público. «Zéfiro». Cinecartaz. Consultado em 22 de março de 2021
- ↑ «"Peixe Lua" 2000 | José Álvaro Morais Quando, na derradeira sequência de "O bobo" (1987), o protagonista da obr» (PDF). webcache.googleusercontent.com. Consultado em 22 de março de 2021
- ↑ Infopédia. «José Álvaro Morais - Infopédia». Infopédia - Dicionários Porto Editora. Consultado em 22 de março de 2021
- ↑ «Cinema e Portugal: não reconciliados Autor(es): Cruchinho, Fausto Publicado por: Imprensa da Universidade de Coimbra URL persis» (PDF). webcache.googleusercontent.com. Consultado em 22 de março de 2021
- ↑ «José Álvaro Morais: Indizível, infilmável». SEPTIMA. 4 de julho de 2019. Consultado em 22 de março de 2021
Ligações externas
[editar | editar código-fonte]- Filmes em língua portuguesa
- Filmes de Portugal de 1993
- Filmes de drama de Portugal
- Filmes de drama da década de 1990
- Documentários de Portugal
- Filmes realizados por José Álvaro Morais
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